Como o linho levava tantas e tantas voltas, a dobadora também
dava voltas, dessas tantas e tantas que o linho levava serões e serões que
preocupava o povo do campo sobretudo a mulher para dar a parte final das voltas
do linho para entrar no tear, sair em tecido e depois branquiar para fazer
enxovais para os seus proprios vestuários.
O
linho ia para a dobadoura para ser dobado em novelos. Colocam-se em meadas na
dobadoura, porém, são muitos os nós e os emaranhados a desfazer até se obterem
novelos. Assim se cantava como um lamento:
"Doba, doba dobadoura
Não me prendas a meada
Deixa correr o novelo
Tenho a minha mão cansada"
"As
voltas que o linho leva
Antes de entrar no tear
São tantas como as voltas do vira
Que esta noite vou dar" |
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O linho era uma faina difícil do trabalho do
campo, mas pela boa vontade e amor ao linho, tudo seria feito com alegria
cantando e dançando durante arrancada . No final ainda mostrando que acarinhavam
o linho, ficavam dançando até outra, mesmo uma espadelada para não esquecer
alegria que o linho lhe davam.
«Era
alegria do linho»
A colheita
do linho é feita no principio do mês de julho. Depois de arrancado é levado para
eira em carros de bois, e depois é distribuído em mão cheia para ripar.
Durante este trabalho toda a gente canta e dança
canções das fainas agrícolas.
"As
voltas que o linho leva,
antes de ir prà tecedeira!
Eu inda dava
mais voltas
para
estar à tua beira" |
Depois de um longo dia de trabalho
cheio de cansaço e por vezes árduo, quando chegava a noite, o tempo ainda era
aproveitado para fiar o linho com a sua roca e o seu fuso, ou fazer meias,
camisolas, bordar para o seu enxoval, e ao mesmo tempo entre famílias contavam
continhos ou histórias.
Apreciavam o calor da lareira e o cantar do tronco da árvore a arder.
Era um bom serão a moda do povo do campo.
Durante
muitos séculos a transformação das fibras têxteis em fio esteve puramente
confinada à indústria caseira e praticamente só realizada por mulheres. Os
únicos utensilios utilizados na fiação eram a roca e o fuso. Com estes
utensilios a mulher fiandeira, para obter o fio, principiava por colocar a rama
de linho previamente cardada na roca, depois com a mão esquerda retirava uma
porção de fibras, juntava-se e colocava-se no fuso segurando a ponta deste entre
os dedos polegar e indicador da mão directa, dando-lhe um movimento rotativo
afim que o filamento se torcesse para formar um fio redondo, depois dava-lhe um
movimento contrário de rotação e o fio obtido era enrolado no fuso, umas vezes
de baixo para cima, outras de cima para baixo.
"Quem
me dera ser o linho
Que vós na roca fiais,
Quem me dera tantos beijos
Como vós no linho dais."
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A Espadelada é uma das fases do preparo do
linho, pretexto, antigamente, para serões prolongados onde se reuniam várias
pessoas, num ambiente de festa e também de namoro. Antes de chegar ao momento de
ser espadelado, o linho passa por diversas fases, daí a conhecida frase: “as
voltas que o linho dá”.
"Espedelar o
linho
O linho devagar,
Espedelar o linho
À noite ao luar."
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Antes de chegar à fase de ser
espadelado, o linho passa por diversas situações. Para fazer uma descrição
completa das “voltas que o linho dá”, teríamos de ocupar quase toda esta página,
no entanto, para aqueles que nunca viram ou para outros recordarem, vamos dar
uma ligeira descrição.
O linho é semeado para ser arrancado. Arrancado e
não cortado. Depois de arrancado é levado para as eiras onde é derripado para se
tirar a baganha, ou seja, a semente, mais conhecida como linhaça.
Depois desta fase é
amarrado em pequenos molhos e transportado para lagos, tanques ou poços, ficando
dentro d’água de 8 a 15 dias para apodrecer. Tirado da água é lavado em outra
água limpa e posto a secar em terreno com relva. Uma vez seco vai para o engenho
que é construído de madeira e movido a água e aí o linho será moído. Ao sair do
engenho é que o linho está na fase de ser espadelado.
Nos espadeladores ou
cortiços é batido com as espadelas para lhe tirar os tomentos. Depois passa no
sedeiro que o separa da estopa. Está preparado para a roca. A roca é uma vara
que tem na extremidade um bojo onde se enrola o linho ou estriga e dai a moça
fia-o para os fusos. Depois de fiado passa no sarilho que o arruma em meadas. As
meadas depois vão para as dobadeiras que o deixam em pequenos novelos que
servirão para encher as canelas, nos caneleiros. Uma vez prontas as canelas vão
para os teares e colocadas nas lançadeiras e começa a fase de tecelagem. Desses
teares manuais e rudimentares é que saem ricas peças de linho (tecido), com que
se confeccionam os tão apreciados lençóis, toalhas, camisas e outras peças de
vestuário valiosas.
O mais gostoso das
espadeladas, além do preparo do linho, é o ambiente festivo de que se reveste.
Todos aqueles serviços que
descrevemos é feito por senhoras e moças. A dona da casa, no entanto, convidou
outras pessoas, especialmente rapazes para assistirem e alegrarem o serão,
Também aparecem alguns moços que não foram convidados, mas são bem recebidos. E
durante aquela noite toca-se, canta-se e dança-se. Namora-se e trabalha-se.
Quase sempre naquele grupo que não foi convidado vem um rapaz com a finalidade
de pegar em flagrante sua namorada, convidada que foi para trabalhar, namorando
um outro marmanjo. E o barulho é inevitável. É aquela briga de pau que, a não
ser umas pauladas, não tem outras consequências, mesmo porque, a dona da festa,
muito experiente nestes assuntos, aparece com a merenda naquela hora. E todo
mundo come e bebe, canta e dança numa alegria geral. A não ser aquele
casalsinho, ela que estava namorando outro e ele que causou a briga, amuados um
em cada canto da sala. |